segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Culpa Desnecessária

Esta é a CEU, a Casa do Estudante Universitário da UFRGS, na João Pessoa.

-Oi Lia. -Disse a mãe, chegando do trabalho.
-Oi mãe. Vai ficar ocupada agora?
"Você vai me ouvir! Vai me ouvir! Eu consegui o que queria, mãe. Você não vai me impedir."
-Não.
"É agora!"
-Preciso conversar com você. Bem mãe, eu passei no vestibular... Eu QUERO fazer a faculdade.
"Eu vou ir atraz do que eu quero. Eu PASSEI no vestibular. Agora posso ir atraz do meu sonho."
-Como Lia? Vai se teletransportar para Porto Alegre todo o dia?
"Para que ser irônica, mãe? Não faça eu me irritar com você."
-Eu voi ir morar lá, mãe.
"Você vai ter de aceitar isso."
-Isso até tem graça, Lia.
"Será que você não engole que eu vou sair um dia do seu controle? Será que você não aceita que eu conquiste a minha liberdade?"
-Eu posso ficar numa casa de estudantes.
"Eu já me informei sobre tudo. Eu sei o que devo fazer."
-E quem vai cuidar de você, Lia?
"Se você continuar intransigente vou ter de fazer o que preciso sem a sua permissão. Mas no fundo, eu gostaria que você me entendesse."
-Eu sei me cuidar sozinha, mãe.
"Mas eu queria era que você me apoiasse. Mas não vou dar para traz."
-Bem, suponhamos que você saiba se cuidar sozinha: como fico eu aqui, Lia?
"Mãe, eu não vou cair nesse seu jogo. Eu não posso! Não posso! Eu gosto muito de você, mãe. Mas não vou me deixar levar mesmo que eu morra de culpa depois."
-Ah, não faz chantagem, mãe.
"Você está sendo muito cruel. Está tentando provocar uma culpa desnecessária, que não se justifica..."
-Não é chantagem, Lia. ocê é minha única filha.
"Se você não teve mais filhos foi por que não quiz. E você sabe se cuidar sozinha."
-Mas eu não vou desistir do meu futuro, mãe!
"Eu não posso restringir a minha vida a essa cidadezinha onde não tenho chance de progredir. Eu tenho capacidade, posso desenvolvê-la. Quero estudar!"
-Esse assunto morreu aqui, Lia. Você vai ficar morando aqui comigo e vai cuidar de mim assim como eu cuidei de você quando você era pequena.
"Você está me forçando a fazer algo que eu não quero, mãe. Eu vou estudar em Porto Alegre. Eu vou atraz do meu sonho."

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Névoa Branca


Fazia frio dentro de mim.
Algo me incomodava, me fazia ficar desesperada...
Lá fora, tudo continuava terrivelmente impessoal. Injustiças acontecendo sempre. Competição. Pessoas afastadas, umas contra as outras... Só a união mudaria isso. Mas a situação não favorecia a união. Círculo vicioso.
Era nesse mundo que eu procurava meu lugar, meu papel. Não encontrava. Eu estava pensando nisso.
O frio de dentro de mim começou a tomar volume, não parava de aumentar. Uma névoa começou a escapar de meu interior, como água branca de cloro quando derramada.
Essa névoa crescia, se alimentava do frio de dentro de mim. Me envolvia, cada vez mais densa. Lentamente começou a me sufocar.
Tentei aplacar aquele frio. Em vão! O mundo lá fora não emanava calor. O frio não morava apenas no meu interior. O que eu poderiafazer? A névoa continuava a crescer e a me envolver. Era muito maior do que eu. Eu chorava. Acreditava que o mundo impessoal era a causa do meu desespero. Acreditava-me pequena e fraca. Mais do que isso: incapaz. Então ouvi: "Seja forte." Achei que era uma alucinação. Era uma voz grave e bonita que me falava. "Seja forte." Ouvi novamente. Fiquei bastante confusa, mas a névoa pareceu perder um pouco da desnsidade. Parecia que a simples possibilidade de alguém estar me ouvindo diminuiu o frio de dentro de mim. "Essa névoa não irá deixá-la em paz enquanto houver frio dentro de você." "E como faço para me esquentar? O frio está por toda parte." "Pense em algo que dê calor." "Mas o que...?" "Rápido! Senão a névoa volta a crescer." Me disse a voz com urgência. Do nada, comecei a recitar um poema de Bandeira. A névoa ficou mais tênue. "Isso! Continue!" Emendei uma de Drummond. A névoa diminuiu. Continuei por mais algum tempo. Aquela voz sempre me lembrava de que estava me ouvindo. Depois de algum tempo de luta a névoa desapareceu por completo. "Você sempre me ouve?" "Sim pois passei por algo semelhante." "Onde você está?" "Dentro de você." "Como você pôde me ajudar?" "Porque você permitiu." "O que devo fazer para vencer a névoa?" "Pode ser recitando. Mas dev ser algo de que você goste muito. Se não resolver, coloque uma música e cante. E se concentre na canção..."Mas como você sabia o que fazer?" "Eu também sentia frio dentro de mim. Muitas vezes a névoa tentou me sufocar e não conseguiu. Sempre que ela surgia eu cantava. Mas certa vez não consegui controlá-la, então ela me consumiu..." Fiquei espantada! "No entanto muita gente me viu cantar. E minha voz ficará para sempre dentro deles."
-------------------------------------------
"Eu acredito que a cadência e a harmonia certas no momento certo podem despertar qualquer sentimento, inclusive o da felicidade nos momentos mais sombrios” (Yoñlu)

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Te desejo um final feliz, Escola Santa Rita


Eu gosto de falar em Educação. E estou particular preocupada com algo que está acontecendo em Gravataí.
Estão querendo fechar minha saudosa Escola Mun. Santa Rita.
Desde a época em que eu estudava lá haviam boatos de que a prefeitura estava tentando se livrar da escola. Queriam passá-la para o estado, afinal a escola tinha ensino Fundamental e Médio e o Município só é responsável pelo Fundamental. Claro que empurrar uma escola para o Estado assim não é nada fácil. Agora a prefeitura resolveu mudar de tática.
Há algum tempo fui surpreendida com um recado da minha ex professora no orkut. A Sora contava que queriam entregar o prédio da escola para o governo federal para que lá funcionasse uma Escola Técnica. A comunidade, que sempre foi o grande motor daquela escola, reagiu dizendo que havia a possibilidade de se construir o prédio da Escola Técnica no pátio da escola. E é verdade. Me lembro que o pátio era enorme e a maior parte do mesmo não era nem aberta para os alunos no recreio. Não há a nece4ssidade de fechar a escola.
Mas recentemente, assistindo ao vídeo da ANEL sobre a Audiência Pública que houve na Câmara municipal de Gravataí, descobri que a Diretora foi até Brasília e obteve do Ministério da Educação a informação de que ainda não foi decidido se a Escola Técnica Federal irá mesmo para Gravataí. E que se realmente for, será construído um prédio navo para seu funcionamento. Ou seja, se fecharem o Santa Rita será para que nada mais funcione lá.
No Santa Rita estudam cerca de 1700 alunos. Em caso de fechamento, esses alunos serão mandados para outras escolas municipais, e terão de atravessar a "faixa" (Av. Dorival Cândido Luz de Oliveira) para estudar todos os dias. Me lembro que quando eu era pequena, um garoto que ia para escola foi atropelado ao atravessar a Faixa. Fizemos uma manifestação. Foi também uma forma de pressionar a Prefeitura para que entregasse o prédio novo da escola (esse mesmo que hoje querem fechar). O prédio antigo tinha um valão que cortava o pátio, o que era perigoso para os alunos, e corria risco de desabamento. Devemos lembrar também que os pais de muitos alunos não dispõe de tempo para levar os filhos à escola. Precisamos evitar que outros acidentes assim aconteçam.
A prefeitura sempre gostou de se vangloriar de ter uma escola de ensino Médio. No entanto, quando houve a mudança da Escola (em agosto de 1998) foram os professores e um caminhão cedido por uma transportadora que gentilmente levaram os móveis, arquivos e etc. para a escola. A comunidade foi quem sempre esteve, junto com alunos e professores, tocando a escola. Havia um forte clima de democracia, todos éramos ouvidos. A diretoria era bastante aberta. Tínhamos assembléias trimestrais onde fazíamos reivindicações e, em geral, éramos atendidos. As aulas eram críticas, haviam discussões. Era uma escola que essencialmente formava cidadãos.
E a postura da prefeitura nisso tudo foi bastante autoritária. No dia da audiência mandou CCs levarem faixas de apoio ao fechamento da escola! Não quis ouvir a comunidade do Santa Rita. Mas muitas pessoas lotaram a Câmara e demonstraram a verdadeira opinião da comunidade.
Como estou morando em Porto Alegre, não tenho podido acompanhar de perto a "evolução desse quadro". Mas fiz esse post no blog e coloquei no meu perfil no orkut, estou tentando militar à distância. Estou na torcida para que tudo isso tenha um final feliz.

sábado, 4 de setembro de 2010

Uma Gota de Esperantoso


Aí vai meu último conto. Peço perdão, escrevi as pressas com medo de acabar não escrevendo. A inspiração foi esse post do blog Contos do Léo, que eu recomendo que leiam para entender melhor o meu conto. Recomendo o blog como um todo também.

Como em Plantaverde poucos sabiam Esperantoso e os editores que publicavam nesse idioma faziam questão de publicar aos montes, achando que assim todos passariam a querer aprender o idioma, os livros em Esperantoso eram baratos.
Gota quis. Sozinha estudou Esperantoso porque gostava de livros, que no idioma nativo eram muito caros.
E a Gota adorava também a idéia do Esperantoso de unir todos os mundos.
Sua pronúncia ficou perfeita. Sua escrita também. Compreendia mesmo as formações sintáticas mais complicadas. Compreendia o que o escritor quis transmitir mesmo com as aliterações mais peculiares do Esperantoso e adorava reparar diferenças de estilística e estética.
Mas o prblema maior a língua por si só não resolvia. Ela sabia que quase todo mundo ganhava pouca plantaverde trabalhando muito para meia dúzia de seres ganharem demais quase sem trabalhar.
Se a maioria trabalha muito, não chega a ler e por vezes nem a sentir.
Assim, as aliterações, metáforas, antíteses, prosopopéias ficavam bem longe do cotidiano. Seus pais diziam pra arranjar logo um trabalho, sem tentar estudar pra ser professora de Esperantoso como ela queria. Mas se não era pra poder se emocionar um pouco, para que a vida servia? Ela queria ensinar isso. Mas o mundo era tão mecânico...
Certa vez, Gota estava na praça da Coruja, onde os jovens que estudavam E
sperantoso se reuniam para conversar nesse idioma. Apareceram umas pessoas com umas idéias bem malucas. Um projeto de haver salário de 10 quilos de plantaverde para todos no fim do mês. Mas para isso todos precisariam se unir, para criar uma sociedade onde todos poderiam estudar, trabalhar no que quizessem sem pressão, ler, e viver a literatura da vida.
Será que se desse certo ela poderia ensinar seua alunos a viver com aliterações, metáforas, antíteses, prosopopéias? Será que ela poderia transformar a vida das pessoas em um texto um pouco mais rico do que um lista de compras???
E começou a trabalhar para isso. Conversava com um. Depois com outro. Quase ninguém a entendia. Mas aqueles que deram ess idéia à Gota a incentivavam...
Todos dos arredores sabiam quem era a Gota. Sabiam de suas idéias malucas. Sabiam que ela não era muito normal.
Um dia o prefeito baixou o salários dos professores para um quilo e meio de plantaverde. Gota e seus amigos de idéias malucas levaram tampas de panela e colheres para fazer barulho na frente da prefeitura. Os guardas atiraram raios de calor paralizante de cor alaranjada viva para conter os malucos que ousavam
atrapalhar o trabalho do senhor prefeito, que recebia vinte quilos de plantaverde de salário por mês mais benefícios. Nessa hora, Gota entrou em ebulição e virou vapor.
Até hoje não se sabe se Gota virou vapor por causa dos raios ou se foi sua animação na luta pelo que acreditava que a fez ferver. O que se sabe é que depois da primeira chuva que caiu após aquele dia todos começaram a ouvir com maior interesse os malucos que defendiam as mesmas idéias que Gota. Afinal, idéias não evaporam com facilidade.

Eu me permito morrer

Descrição. Pintura em tons de marrom e verde. Uma mulher de cabelos longos e escuros caminha por uma estrada. Ela usa vestido longo de manga...